A evangelização no Equador

A descoberta e a evangelização da América Latina estão ligadas à data simbólica de 12 de outubro de 1492, quando as caravelas de Cristóvão Colombo, sob a égide dos reis católicos Isabel e Fernando de Espanha, desembarcaram na ilha de Guanahaní (Bahamas), que foi chamada San Salvador, um prenúncio da futura evangelização. Esta começou com os doze sacerdotes que chegaram ao Novo Mundo na segunda expedição de Colombo: foram orientados pelo vigário apostólico Frei Bernardo Boyl que celebrou a primeira missa solene na América em 6 de janeiro de 1494. Estas crónicas marcaram a história fascinante da evangelização de um continente que, no espaço de pouco mais de um século, mudou o rumo da trajetória da humanidade.

Na obra de evangelização houve luzes e sombras porque a difusão do Evangelho no Equador fez parte do processo de colonização do que restava do Império Inca, que ruiu após o assassinato de Atahualpa (1533). Muitos dos franciscanos, mercedários, dominicanos e agostinianos que chegaram às atuais terras equatorianas como capelães das tropas espanholas tinham amadurecido a sua experiência missionária em outras partes do continente. Por isso, em primeiro lugar, procuraram conhecer os habitantes das regiões de Quito, as suas línguas, estruturas sociais, crenças, hábitos e costumes, conscientes de que a melhor forma de evangelizar era fazê-lo na língua indígena, a partir dos filhos dos caciques, os chefes das comunidades tribais. O tom repressivo dos primeiros contactos deu gradualmente lugar à persuasão: não se impunha a conversão imediata, mas esperava-se a livre adesão dos indígenas, porque a aceitação da fé era incompatível com a coerção.

Pelos dados de que dispomos, a fundação indo-hispânica da cidade de São Francisco de Quito em 1534 é a referência que marcou a história da Igreja nesses territórios. Dois anos após a fundação da cidade, iniciou-se a construção da igreja e convento de São Francisco, conjunto arquitetónico denominado Escorial de los Andes. Nesse local, já estimado pelos indígenas, o padre Rique e os seus companheiros semearam no terreno em frente da nova igreja a primeira semente de trigo da terra fértil do Equador e, com ela, confiaram a boa semente do Evangelho a Quito.

Em 1545 a comunidade quitenha (de Quito) foi elevada a diocese, sufragânea de Lima e as “doctrinas”, núcleo das futuras paróquias, multiplicaram-se graças às congregações religiosas, permitindo o nascimento político da Real Audiência de Quito (29 de agosto de 1563). Depois da adesão também dos jesuítas à obra evangelizadora, a Igreja colonial deu vida a uma rede de escolas que levou à fundação das universidades de São Fulgêncio e de São Gregório, enquanto as artes e os ofícios encontraram a sua expressão máxima nas obras-primas da escola quitenha. Enquanto isso, o Evangelho penetrou na faixa amazónica do país.

A evangelização desenvolveu-se rapidamente a partir dos ambientes urbanos apoiada pelos bispos que convocaram concelhos metropolitanos e sínodos provinciais para orientar a atividade missionária, ratificar os direitos e as liberdades dos indígenas, incentivar a catequese e a pregação nas línguas indígenas através do uso de imagens, da música e do canto. Assim se desenvolveu o grande mosaico da piedade popular que é o tesouro precioso da Igreja Católica na América Latina.

Sem silenciar os erros, é preciso reconhecer que no período colonial a Igreja foi considerada uma “formadora do sentimento nacional” graças à sua atenção às necessidades do povo e à promoção da dignidade dos povos indígenas. Marcos neste trabalho de consolidação social e de serviço pastoral são o Itinerário para os párocos dos índios do bispo de Quito, Alonso de la Pena (+1687), a primeira Carta fundamental do Equador republicano, elaborada pelos sacerdotes da Assembleia eclesiástica quitenha em 1812, a orientação social e científica das cátedras dos jesuítas na Universidade nacional e da primeira escola politécnica. No Equador republicano, bispos, sacerdotes diocesanos, religiosos e religiosas, eminentes leigos construíram e reafirmaram, até hoje, o caráter cristão e cultural do país.

O povo de Deus no Equador é fruto do encontro fecundo com o Evangelho de populações de diferentes culturas, línguas e tradições. A sua fé vivida encontra clara expressão na santidade de numerosos homens e mulheres entre os quais brilham Santa Mariana de Jesus (1618 – 1645), “lírio de Quito”; a “rosa de Baba e Guayaquil”, Beata Mercedes de Jesus (1828 – 1883); Santa Narcisa de Jesus Martillo y Morán (1832-1869), “Menina Narcisa” para muitos devotos; o Beato Emílio Moscoso (1846-1897), mártir da Eucaristia.

Tudo isto ainda hoje é visível nas instituições educativas, nas magníficas obras de arte, nas igrejas da cidade de Quito, declarada “património cultural da humanidade” pela UNESCO. Mas o património mais importante é constituído pelos valores que impregnam as famílias e a sociedade, a vida privada e pública: a sabedoria que vem da memória histórica das derrotas e dos triunfos, da vitalidade dos grandes temas religiosos que inspiram a cultura, a arte, o artesanato, a festa e o repouso, o nascimento e a morte. Um espírito de fraternidade sincera, mais forte que qualquer inimizade violenta, manifesta-se na alegria e no entusiasmo das “mingas”,[1] nas festas, na cordialidade para com os forasteiros, na solidariedade na hora difícil da provação.

O advento do Evangelho de Cristo Salvador nesta terra da América, consagrada desde 1874 ao Sagrado Coração de Jesus, fez amadurecer, entre alegrias e dores, o fruto genuíno de uma Igreja viva que deseja partilhar a sua vitalidade com os peregrinos que, de todas as partes do mundo, chegarão a Quito para celebrar o 53.º Congresso Eucarístico Internacional.


[1] N.T. – Trabalho coletivo com o objetivo de utilidade social e caráter recíproco. Trata-se de uma tradição que remonta à civilização pré-colombiana, consiste no trabalho não remunerado para uma comunidade ou família cuja utilidade direta não beneficia quem o realiza, ou pelo menos não é um benefício privado.