Nelson Faria, sj
Por iniciativa da Conferência Episcopal, celebramos neste ano de 2024 o 5.º Congresso Eucarístico Nacional, na cidade de Braga, de 31 de maio a 2 de junho. Mais do que assinalar o centenário do primeiro congresso, o desejo dos nossos bispos é que redescubramos o pulsar eucarístico da Igreja em Portugal.
A Rede Mundial de Oração do Papa está comprometida com o desejo dos nossos bispos. E por isso mesmo, a revista Mensageiro dedica este espaço à Eucaristia. Pretendemos entrar consigo no mistério eucarístico, apresentando o seu significado profundo, apontando o seu sentido e desafiando cada um a viver eucaristicamente.
Nós podemos rezar de muitas formas. Mas a mais excelsa das orações é a Eucaristia.
Momentos antes da sua agonia e posterior prisão no Jardim das Oliveiras, Jesus instituiu a Eucaristia e pediu aos discípulos que o fizessem em sua memória. Naquele momento, eles não perceberam do que falava. Mas após a Ressurreição, a Eucaristia tornou-se o centro da vida das comunidades cristãs. Ainda o é hoje? Ou será que ficamos num mero «ir à missa»?
A vivência da Eucaristia é uma preocupação constante da Igreja desde os finais do século XIX. Nessa altura, a vida espiritual dos crentes era dominada por devoções particulares e a Eucaristia ocupava um lugar secundário. Dessa inquietação nasceu, nalgumas abadias europeias, um movimento litúrgico que rapidamente se propagou, amadureceu e que influenciou o Concílio Vaticano II.
O Vaticano II declara, sem novidade mas com redobrada força, que a Eucaristia é «fonte e centro de toda a vida cristã» (Lumen Gentium §11). Aliás, o primeiro documento aprovado pelo Concílio é sobre liturgia (Sacrosanctum Concilium), e Bento XVI defende que tal não é um acaso, mas um sinal da extrema necessidade de reforma litúrgica.
Contudo, cinco décadas depois do Concílio, como estão as nossas Eucaristias? Creio que não exagero quando digo que poucos estão satisfeitos. Alguns afirmam que a Eucaristia deveria ser mais solene, enquanto outros se queixam de um défice de proximidade à vida concreta. Uns reclamam música mais contemporânea e outros defendem a reinstituição da polifonia clássica e do canto gregoriano. Muitos declaram que os textos do missal são incompreensíveis e outros apelam ao uso do latim como forma de preservar um sentido de mistério.
Diante deste turbilhão de explicações contraditórias para a atual crise, é prudente assumir que o problema é complexo e a sua fonte está além das causas enunciadas. Sem desvalorizar as aportações das várias sensibilidades, creio que a razão para a atual crise da Eucaristia não está tanto nas opções tomadas pela Igreja, mas na nossa vivência do sacramento.
Sempre existiram vários ritos na Igreja Católica, e ao longo de dois mil anos de celebração, muitas foram as formas encontradas para celebrar
o mesmo mistério. Contudo, há uma só Eucaristia, a de Jesus Cristo. Cada Eucaristia é atualização do sacrifício de Jesus, algo que aconteceu na história mas que ganhou a marca da eternidade na Ressurreição do Senhor.
A Eucaristia não pode ser refém do tempo, das inclinações estéticas ou gostos pessoais de alguns, nem de uma língua ou forma ritual. Este mistério é muito maior que o momento presente e proclama-se de muitas formas. Há que celebrá-lo com dignidade, em abertura ao «agora» da fé, mas conscientes de que não nos pertence e que tem sabor a eternidade.
A liturgia da Eucaristia é a grande escola onde aprendemos a ser como Jesus. Ela é fonte de conversão, numa oração feita de gestos, palavras
e abertura ao Espírito Santo, que nos envia em caminho, de regresso ao mundo, santificados e para santificar.
Comecemos por viver a Eucaristia. Entremos no seu pulsar. Repitamos, no íntimo do nosso coração, cada palavra pronunciada e acompanhemos, com alma, os movimentos do corpo durante a celebração litúrgica. É desta forma que entramos, em passo lento mas certo, numa vivência eucarística que fará de cada um de nós outro Cristo.
In Mensageiro do Coração de Jesus, janeiro de 2024