P. Carlos Vaz
Com toda a razão e propriedade afirmava o papa Francisco, em Verona, norte de Itália, no sábado, dia 18, na missa da vigília de Pentecostes: «O Espírito Santo é o protagonista da vida cristã. Está dentro de cada batizado e, mais ainda, de cada confirmado». E eu acrescentaria: «mais deve estar ainda presente em cada ministro ordenado que preside à Eucaristia». Continua o Papa; «É o Espírito Santo que nos dá força e coragem para a vida e o testemunho sincero, atraente e credível». E convidou os presentes a repetirem por 3 vezes: «O Espírito Santo muda-nos a vida». Para tal: «é necessário escutá-lo, rezar-lhe e confiar nele, para que possa mudar a nossa vida». Acrescentou ainda: «É o Espírito Santo que infunde o conhecimento de Deus em todos os povos. É Ele o verdadeiro protagonista da missão eclesial. A Igreja, o que faz é reconhecer e secundar a ação do Espírito Santo, que prepara, realiza e consolida a ação do Evangelho em cada homem. É o Espírito Santo que suscita o desejo de felicidade, semeia a semente da Palavra e outorga a fé».
É o Espírito Santo que nos faz filhos de Deus, ‘filhos no Filho’, irmãos de Jesus e seus contemporâneos. É Ele que impede que sejamos catalogados como ‘simples continuadores de Jesus’. (António Couto) É também o atual bispo de Lamego que, no precioso livro «No meu posto de sentinela o dia inteiro», afirma: «Falamos quase sempre antes do tempo, e não chegamos a dar lugar à suave voz do Espírito. ‘Não sois vós que falais, mas o Espírito Santo’ (Mc 13, 11; Mt 10, 20; Lc 12,12). Muito mais evidente é isto no sacerdote que preside à Eucaristia. Por isso é tristemente elucidativo e estranho o ambiente de dispersão, descontração e falatório que se observa em muitos presbíteros, poucos minutos antes de se encaminharem para o altar. Como conseguirão presidir de tal maneira que seja o Espírito Santo a falar realmente neles e através deles? Como será possível exteriorizar de verdade o maravilhamento que estão chamados a sentir e vivenciar?
Não foi a Igreja que inventou a Eucaristia. Não somos nós os donos da celebração. Tem de ser o Espírito Santo o protagonista, em nós e através de nós. É uma responsabilidade tremenda, mas, ao mesmo tempo, fascinante e maravilhosa. E o celebrante, queira ou não, mostra se está maravilhado com o que celebra, ou se está simplesmente acomodado na função, pouco mais que papagaio que repete, mas que não sente vivamente o que está a dizer e muito menos saboreia e dá a saborear o que tem a oportunidade de poder mostrar.
Dois famosos médicos da Universidade de Harvard, publicaram, no ano 2000, um livro que muito me ajudou a aprofundar a vivência que estou chamado a experimentar em cada celebração eucarística. O Título é: «Tu és o que dizes». Entre muitas outras coisas interessantíssimas, destaco: «Com a linguagem mudamos a vida. Sem linguagem, somos parecidos a chimpanzés. A linguagem desempenha um papel central na vida humana». Falam inclusive do poder curativo da linguagem, se devidamente utilizada e incarnada.
Já em 1991, adquiri um livro, também de um famoso médico espanhol, José António Vallejo Nágera: «Aprender a hablar en público hoy», com o subtítulo; ‘La oratória eficaz, cómo cautivar y convencer por medio de la palabra». Conhecia-o de programas na televisão espanhola, onde era muito apreciado, de tal modo que o livro foi editado em abril de 1990, e, em maio de 1991, já ia em 19 edições e 232.000 exemplares. É ele mesmo que conta alguns dos segredos que lhe permitiram passar de uma pessoa tímida e com receio dos palcos, a um orador convincente, cativante e sumamente atraente. Um orador que empolgava as plateias.
Em 2008, a equipa de formação sacerdotal da arquidiocese de Braga promoveu uma ação de formação de dois dias com o professor Arturo Merayo, autor do «Curso prático de técnicas de comunicación oral». Ele foi incisivo e mostrou bem como o falar em público exige contínua aprendizagem e muita atenção, sobretudo em atividades tão exigentes como é a celebração da Eucaristia. Mostrou inclusive a diferença entre pronunciar as palavras da consagração como uma frase qualquer, ou pronunciadas com a vivência que lhes deve ser dada. E que uma coisa é uma saudação; outra, um diálogo; outra, uma oração, a recitação de um hino, a proclamação de uma leitura, a especial atenção que deve merecer a proclamação do Evangelho, etc. E o especial lugar que deve ocupar o silêncio, a todos os níveis.
Infelizmente, continuo a observar que as pessoas não realçam as frases que proferem quando convidadas a recitar em conjunto. Dificilmente se nota um maravilhamento no que se está a proferir com as palavras que a liturgia nos oferece. O ritmo de elocução é, geralmente, demasiado rápido desigual, e parece haver uma preocupação de acabar depressa, encavalitando as frases dos diálogos, sem dar tempo a que ecoem em nós e possam ser saboreadas, bem como os próprios possam respirar adequadamente, para poderem também realçar o que deve ser salientado e enfatizado.
Para mim, um dos grandes frutos do Congresso Eucarístico seria que os sacerdotes se dispusessem a dar total prioridade à celebração da eucaristia, aprofundando cada dia mais o seu conhecimento e sobretudo a preparação próxima para a celebração, de modo que os fiéis possam ver e sentir que o sacerdote acredita e vive de verdade aquilo que está a celebrar. E, por isso, os motiva e cativa. Pois, parafraseando os médicos de Harvard: «Pelo modo como celebras, estás a revelar que lugar a Eucaristia ocupa na tua vida». Os fiéis podem não ter tanto conhecimento teológico sobre a eucaristia, mas depreendem muito bem se o sacerdote está realmente convicto, compenetrado e sobretudo maravilhado com o que está a celebrar». Se estas três atitudes se verificarem, eles sentir-se-ão alegremente interpelados e partilharão também de igual maravilhamento, expresso nas diversas formas de participação a que são chamados ao longo da celebração. E uma vivência assim será a primeira grande evangelização.
[Continuará]